Sexta-feira, 17 de Julho de 2009

CESTAS DE POESIA

Hoje, não um, mas dois poemas de um poeta e insigne açoriano que dá pelo nome de: Pedro da Silveira, um  nome e uma obra a descobrir.

PEDRO DA SILVEIRA


ELEGIA, QUASE



Defronte da minha janela
o vento agora embala
as flores lilases dos jacarandás.


A tarde cai, cansada,
e não sei porquê
de repente lembrei-me
que foi numa tarde como esta
sob uma brisa morna
que nos dissemos adeus.


No entanto não recordo
se havia flores ou simplesmente
era a tarde, sem paisagem nenhuma.
O que ainda sei é o teu vulto
emoldurado no sol -
e depois a casa
onde já não vive ninguém.


Tantas casas desertas
e tantos rostos para sempre inencontráveis.




MEMÓRIAS

À memória de António Dacosta
que, pintor e poeta,
sabia de sereias e tritões
como meu avô José Laureano


1

Perdi os nomes da inocência.
A ignorância,
continuo a aprendê-la.


2

Tinem campainhas
no azul novo da manhã.
Vacas a caminho das relvas.


3

A mesa está posta. Come
como quem beija
o pão duro da vida.

 

 


Pedro da Silveira

Pedro Laureano de Mendonça da Silveira (Fajã Grande, 5.9.1922 - Lisboa, 13.4.2003), nascido na freguesia florentina menos distante do continente americano, foi apelidado, com propriedade "o mais ocidental poeta europeu".

Afirmou-se, politicamente, anarquista dada a admiração nutrida pelos anarco-sindicalistas terceirenses Jaime Brasil e Aurélio Quintanilha.

Toda a vida cultivou estreita relação com a escrita, o que fez dele poeta, investigador histórico e crítico literário, realizando também trabalho sobre a etnografia da ilha das Flores, onde recolheu romances, provérbios, contos e adivinhas, o que lhe permitiu transpor a fala do povo para alguns dos poemas que compôs.

Dispersou o seu labor incessante por diversas áreas (P. da S. foi um das formas como assinou), desde logo colaborando na imprensa escrita (insular, continental e estrangeira) entre outras na Seara Nova (a cujo conselho de redacção pertenceu até 1974), na Colóquio-Letras (1973-1991) e na Vértice.

Foi no jornal micaelense A Ilha que a partir de 1945, deu a conhecer uma das expressões da cabo-verdianidade (revista Claridade (1936) movimento literário cuja divulgação, em Portugal, muito lhe deve.

Entre as décadas de 50 e de 80 do século XX, pelo menos, dedicou-se a traduzir textos de várias áreas temáticas que, por vezes também adaptou, como foi o caso de D. Quixote de la Mancha, da «Biblioteca dos Rapazes».

A poesia, contudo, corria-lhe nas veias e, além da obra que legou à posteridade, abalançou-se a verter de várias línguas, tarefa que lhe ocupou perto de três décadas, um total de cerca de 200 poemas de 60 poetas, oriundos de vários países e de diversas épocas, compilados na soberba colectânea Mesa de Amigos que conheceu, até agora, duas edições.

O seu "exílio" na capital, teve início, em 1951, mas a ilha e o arquipélago natal eram-lhe inseparáveis e proclamava-o à saciedade. No prefácio à primeira antologia de poetas açorianos que elaborou, com a lucidez que o caracterizava, autonomizava a literatura açorense das restantes literaturas de expressão portuguesa.

O rigor e a perfeição eram suas preocupações dominantes tendo sido um dos inspiradores da «Enciclopédia Açoriana», pese embora não ter vivido para a ver concretizada. A generosidade com que partilhava informações e a disponibilidade para encontrar o que parecia inexistente tornou-o inesquecível a quantos o conheceram na Biblioteca Nacional, de onde se reformou em 1992 e à qual doou o seu espólio que ali se encontra ao dispor dos investigadores.

Pedro da Silveira, que cursou a Universidade da vida, permanecerá como "um exemplo, sadio e forte, do que é ser-se açoriano no Mundo".

Obras de Poesia: A Ilha e o Mundo, 1952; Sinais de Oeste, 1962; Corografias, [1985]; Poemas Ausentes, 1999; Fui ao Mar Buscar Laranjas I, Angra do Heroísmo, 1999 (único volume da sua obra completa publicado)

Obras Diversas: Mesa de Amigos, 2.ª edição, 2002 (selecção e tradução); 43 Médicos Poetas (antologia) 1999; Mais alguns romances da Ilha das Flores, 1986; Os últimos luso-brasileiros: sobre a participação de brasileiros nos movimentos literários portugueses do Realismo à dissolução do Simbolismo, 1981; Antologia de poesia açoriana: do século XVIII a 1975, 1977; "Açores", Grande Dicionário de Literatura Portuguesa e de Teoria Literária (coord. João José Cochofel), 1977, 1.º vol.; Miguel de Cervantes Saavedra, D. Quixote de la Mancha, 1966; "Para a história do povoamento das Ilhas das Flores e do Corvo: com três documentos inéditos", Boletim do Núcleo Cultural da Horta, Faial, 2, 1960, pp. 175-198.

Biografias: Álamo Oliveira, "Pedro da Silveira (1922-2003) - Um breve perfil", Boletim do Núcleo Cultural da Horta, Faial, 13, 2004, pp. 75-80; Boletim do Núcleo Cultural da Horta, Faial, 15, 2006, pp. 9-116 (toda a Secção Temática).

 

in: "Projecto Vercial"


publicado por felismundo às 07:00
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6 comentários:
De Emiéle a 17 de Julho de 2009 às 08:27
Não tem nada a ver com o post, mas era para referir que só agora reparei que tens os «últimos comentários». Se calhar já estavam há tempos e eu sem ver...
Bom melhoramento! Dá muito jeito, sobretudo se entrarem a tempo como me parece que aqui acontece - lá no Pópulo demoram bastante a entrar...


De felismundo a 17 de Julho de 2009 às 11:20
Já, há uns tempos.
Vi que tinhas, achei bem e procurei inteirar-me se havia a funcionalidade. Encontrei-a e, não hesitei . É de uma extrema utilidade.


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