Sexta-feira, 5 de Fevereiro de 2010

CESTAS DE POESIA

in "mota_34.blogs.sapo.pt"

 

POESIA POPULAR

do Livro "Cosme de Campos Callado - O Homem e a Obra - 1948-2008", com edição da Fundação Abreu Callado, em Dezembro de 2008. Na página 36 e sob a responsabilidade de Fernando Máximo, escreve-se:


" ...Jaime Velez, por alcunha "O Manta Branca", nascido em Benavila a 30 de Julho de 1894. Jaime Velez foi ganhão e era analfabeto. No entanto, tinha uma veia poética e repentista que lhe permitia em qualquer situação responder a um desafio, versejando sempre...... São diversos os episódios conhecidos que fazem parte da sua longa história de vida. Um dos mais repetidos e que merece ser mencionado, prende-se com o facto de em certa ocasião, na casa do seu patrão se ter feito uma grande festa e estando inclusivamente entre os convidados um ministro. Jaime foi instado a que dissesse uns versos para animar a festa. Resistiu quanto pôde, mas achando ali mais uma oportunidade de poder defender os trabalhadores e zurzir no poder instalado, acabou por aceder depois do patrão lhe ter assegurado que nenhum mal lhe adviria. E disse então a seguinte quadra:

Não vejo senão canalha
De banquete para banquete,
Quem produz e quem trabalha
Come açordas sem "azête"

Depois, de modo repentista, vieram os restantes versos que compunham as décimas:

Ainda o que mais me admira
E penso vezes a miúdo:
Dizem que o sol nasce para tudo
Mas eu digo que é mentira.
Se o pobrezinho conspira
O burguês com ele ralha,
Até diz que o põe à calha
Nem à porta o pode ver.
A não trabalhar e só comer
Não vejo senão canalha!

Quem passa a vida arrastado
Por se ver alegre um dia
Logo diz a burguesia
Que é muito mal governado,
Que é um grande relaxado,
Que anda só no bote e "dête".
Antes que o pobrezinho "respête"
Tratam-no sempre ao desdém
E vê-se andar, quem muito tem,
De banquete para banquete.

É um viver tão diferente
Só o rico tem valor.
E o pobre trabalhador
Vai morrendo lentamente.
A fraqueza o põe doente
E a miséria o atrapalha;
Leva no peito a medalha
Que ganhou à chuva e ao vento
E morre à falta de alimento
Quem produz e quem trabalha

Feliz de quem é patrão
E pobre de quem é criado
Que até dão por mal empregado
O poucochinho que lhe dão.
Quem semeia e colhe o pão
Não tem aonde se "dête",
Só tem quem o "assujête"
Para que toda a vida chore,
E em paga do seu suor
Come açordas sem "azête" "
 


publicado por felismundo às 08:00
link do post | comentar | favorito
6 comentários:
De emiéle a 7 de Fevereiro de 2010 às 11:37
Mais uma novidade.
Não conhecia de todo.
Esta «Cancioneiro da Sesta» vai enriquecendo...


De felismundo a 8 de Fevereiro de 2010 às 22:45
Esta novidade, como lhe chamas, existe em grande número e um pouco por todo este nosso Portugal.
Saibamos, nós, divulgá-los e acarinhá-los enquanto vivos. O Jaime da "Manta Branca", já cá não está mas foi bem divulgado na sua área de vivência. Chegou agora a hora de o dar a conhecer duma outra forma. A poesia popular, às vezes não é fácil de fazer chegar ao grande público até do ponto de vista temporal, por isso só depois da sua morte conseguimos fazê-lo, mas há que lutar para que assim não seja.


De Anónimo a 10 de Fevereiro de 2010 às 22:13
ola. sei que estou muito atrasada, mas acredita que é por causas alheias a minha vontade. já não vinha a net há muito tempo.
gostei muito do poema. faz lembrar o nosso António Aleixo.
os poetas sábios e populares sempre presentes.
como vão os açores?
desejo que a terra não tenha tremido tanto,como li nos jornais...
abraço
silvya


De felismundo a 11 de Fevereiro de 2010 às 13:09
Olá Silvya!
Começo por te informar que, depois de dias de intensa chuva e vento, demasiado forte, para o meu gosto, hoje está um dia lindo!
Quanto ao poeta e à sua poesia, só te digo o seguinte: Este conheci-o bem. Era eu rapaz novo e já ele tinha uma fama enorme naquelas paragens, sempre acutilante e acertível, no confronto com o patronato opressor e todas as injustiças que se viviam. Compára-lo com o António Aleixo e fazes bem pois são muito parecidos, com uma simples diferença o António Aleixo teve a sorte de ter um amigo, o Dr. Joaquim Magalhães, que foi reitor do Liceu de Faro e que, nas palavras do poeta era o "seu secretário". A ela se deve a recolha e registo de toda a sua obra. Saliente-se também o auxílio que um outro algarvio, José Rosa Madeira, lhe proporcionou, quando da edição e lançamento da sua primeira obra, editada pelo Centro Cultural do Algarve, "Quando Começo a Cantar".


De Anónimo a 28 de Dezembro de 2020 às 20:02
Um amigo portalegrense contou-me uma outra história do Manta Branca. Respondendo a alguém que o avisava dos perigos de adormecer ao sol, o Jaime versejou:

"O sol é a minha 'crença'
e ainda que morra queimado,
o sol já me não compensa
do frio que tenho passado"

Palavras premonitórias - Jaime viria a morrer queimado no casebre que lhe servia de abrigo.


De Anónimo a 17 de Novembro de 2022 às 11:38
Mote

Não vejo senão canalhas
De banquete em banquete,
Quem produz e quem trabalha
Come açordas sem azeite.

Jaime da Manta Branca

Glosas

O país foi saqueado
Por um bando de ladrões,
Conhecem-se os vilões
Mas ninguém é condenado.
O povo anestesiado
Vai comendo migalhas,
Sustenta estes metralhas
E as suas mordomias…
Em nome das democracias
Não vejo senão canalhas.

Político ou banqueiro
A tudo deitam mão…
Instalou-se a corrupção,
Não paga nem o primeiro!
Roubam o nosso dinheiro
Com leis de gabinete,
Nós somos um joguete
Nas mãos desta praga…
Comem, e a gente paga
De banquete em banquete.

Parasitas da sociedade
Que se alimentam do povo,
Um verdadeiro estorvo
Pra haver mais igualdade.
A vilaníssima ruindade
Recebe honras da escumalha,
Condecorada com medalha
Por um sistema falido…
No final vê-se fodido
Quem produz e quem trabalha.

Dinheiro que é do país
Em paraísos fiscais…
Pobreza, cada vez há mais,
Está tudo podre de raiz!
Ao gatuno nada lhe diz
Que o pobre se endireite,
Para seu rico deleite
Rouba tudo o que puder…
E o povo, se Deus quiser,
Come açordas sem azeite.

Carlos Biga


Comentar post

.mais sobre mim


. ver perfil

. seguir perfil

. 10 seguidores

.pesquisar

 

.Outubro 2013

Dom
Seg
Ter
Qua
Qui
Sex
Sab

1
2
3
4
5

6
7
8
9
10
11
12

13
14
15
16
17
18
19

21
22
23
24
25
26

27
28
29
30
31


.Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

.posts recentes

. AOS DOMINGOS POESIA

. ...

. POESIA POPULAR ALENTEJANA

. LEMBRANDO A INFÂNCIA

. BENFICA 2 - PORTO 2

. ...

. A poesia de Fernando Pess...

. TENTEMOS UM RECOMEÇO, PEL...

. É BOM OUVIRMOS OS "MAIS V...

. MUDANÇAS

.arquivos

. Outubro 2013

. Junho 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Novembro 2012

. Setembro 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Fevereiro 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

. Maio 2008

. Abril 2008

. Março 2008

. Fevereiro 2008

. Janeiro 2008

. Dezembro 2007

. Novembro 2007

. Outubro 2007

. Setembro 2007

. Agosto 2007

. Julho 2007

. Junho 2007

. Maio 2007

. Abril 2007

. Março 2007

. Fevereiro 2007

. Janeiro 2007

. Dezembro 2006

. Novembro 2006

. Outubro 2006

. Setembro 2006

. Agosto 2006

. Julho 2006

. Junho 2006

. Maio 2006

. Abril 2006

. Março 2006

. Fevereiro 2006

. Janeiro 2006

. Dezembro 2005

. Novembro 2005

. Outubro 2005

. Setembro 2005

. Agosto 2005

. Julho 2005

.últ. comentários

MoteNão vejo senão canalhasDe banquete em banquete...
Prestige Park Grove (https://www.prestigeparksgrov...
Thanks for sharing from Tata Carnatica
Boa TardeGostava de saber quem é o Anónimo que tem...
Um amigo portalegrense contou-me uma outra históri...
sou de peroguarda, gostava do seu contacto se poss...
Sou de Peroguarda tenho alguns poemas como o da ab...
Boa tarde,Seria possível aceder a esse bloco de po...
O poeta António Joaquim lança foi meu bisavô.....t...
Meu caro Armando Facadinhas, só hoje dei pelo teu ...

.links

SAPO Blogs

.subscrever feeds

Em destaque no SAPO Blogs
pub