Sexta-feira, 3 de Novembro de 2006
Ontem, de volta com os meus papeis, fui encontrar um poema de Eugénio Lisboa que gostaria de compartilhar convosco.
Auqi está:
ESTÃO PODRES AS PALAVRAS...
( A Jorge de Sena )
Estãopodres as palavras, Jorge
De passarem por sórdidas mentiras...
Assim o dizes e não pões nem tiras
Ao rijo inventário o teu denso alforge
De palavras talhadas em duro corno
A doçura de uma vírgula que pudesse
Iludir a corrupção que aqui comece
Minando de cuspo a pureza em torno.
Mentem os que falam e os que calam
Mentem os que ficam e os que se vão
Agitam-se os cobardes em fresca encarnação
Da nova coragem com que já abalam.
Que merda de gente ó filho de Camões!
Junto de um seco fero estéril monte
Para onde me retiro, olho e vejo já a ponte
Para onde fogem os altos sonoros campeões!
Usá-las puras as palavras dizes...
Que pureza a desta língua envilecida
Por mil flexões de prostituta ardida?
Língua coleante, dupla rica de matizes...
Possam as palavras ficar enfim erguidas
Um dia como torres entre céu e terra!
Façamos com elas então a nossa guerra
Aos heróis que hoje confundem as saídas!
EUGÉNIO LISBOA
NOTA:
Publicado na página quinzenal de divulgação : Cultura e Arte do Jornal Notícias da Beira - MOÇAMBIQUE, Em 24 de Janeiro de 1975